Como é que as infra-estruturas africanas utilizadas na luta contra a poliomielite ajudaram na resposta à COVID-19

Quando John Achuil, de 28 anos, ligou para o Centro de Operações de Emergência em Saúde Pública de Juba, a capital do Sudão do Sul, com sintomas de COVID-19 (febre e fraqueza no corpo), foi imediatamente levado ao hospital para realizar um teste de rastreio do vírus. Os primeiros intervenientes que ajudaram a salvar a vida do Sr. Achuil eram profissionais de saúde que integravam o programa contra a poliomielite, composto por 400 funcionários e a Equipa de Resposta Rápida nacional, que apoiam actualmente a resposta do Sudão do Sul à COVID-19.

 

“Estou grato aos profissionais de saúde que me salvaram a vida”, afirma o Sr. Achuil, que recuperou da COVID-19 após duas semanas de internamento no hospital. “Nem quero imaginar o que me podia ter acontecido.”

 

O Sr. Achuil não é o único nesta situação. Por toda a África, milhares de pessoas com COVID-19 foram diagnosticadas – o que permitiu que recebessem tratamento rapidamente – ou acabaram por não contraírem o vírus graças aos funcionários e infra-estruturas do continente utilizados na luta contra a poliomielite. 

Por todo o continente africano, existem infra-estruturas e funcionários que trabalham na luta contra a poliomielite desde os níveis distrital e de província, até ao nível nacional; por isso, sempre que ocorre um surto, as equipas de resposta à poliomielite são sempre as primeiras a intervir.

–Dr Sylvester Maleghemi,
Líder da Equipa da OMS responsável pela luta contra a poliomielite no Sudão do Sul

A equipa de resposta à poliomielite da OMS visita o posto fronteiriço de Ambriz, na província de Bengo, para oferecer formação em vigilância e rastreio de contactos tanto para a paralisia flácida aguda (PFA) como para a COVID-19, Angola, Abril de 2020. © OMS 

Em Março de 2020, enquanto o surto evoluía para uma pandemia mundial, o apoio prestado à luta contra a poliomielite foi rapidamente reorientado para a resposta à COVID-19. A Iniciativa Mundial de Erradicação da Poliomielite redireccionou imediatamente os funcionários, recursos e financiamento do programa de erradicação da poliomielite para a resposta mundial à COVID-19. 

 

Na Região Africana, em particular, o programa de erradicação da poliomielite conta com um longo historial de resposta a outros surtos de doenças e a outras emergências de saúde. Com os seus conhecimentos técnicos ímpares, capacidade logística e de vigilância de doenças, bem como redes comunitárias alargadas, a equipa de resposta à poliomielite está numa posição privilegiada para mobilizar uma resposta de emergência em grande escala, ao mesmo tempo que mantém os esforços de erradicação da poliomielite. 

 

“É completamente natural que os profissionais que trabalham na luta contra a poliomielite assumam outras emergências de saúde,” afirma o Dr. Sylvester Maleghemi, líder da Equipa da OMS responsável pela luta contra a poliomielite no Sudão do Sul, que há vários anos apoia os programas nacionais contra a poliomielite e programas mais abrangentes de vacinação. “Por todo o continente africano, existem infra-estruturas e funcionários que trabalham na luta contra a poliomielite desde os níveis distrital e de província, até ao nível nacional; por isso, sempre que ocorre um surto, as equipas de resposta à poliomielite são sempre as primeiras a intervir.”

Um funcionário da equipa da OMS responsável pela resposta à poliomielite forma curandeiros em acções de sensibilização e prevenção da COVID-19 na província de Namibe, em Angola, Abril de 2020. © OMS
A equipa de resposta à poliomielite da OMS visita o hospital distrital de Bengo para oferecer apoio no rastreio e protocolos de isolamento da COVID-19, Abril de 2020. © OMS

Desde Abril, mais de 2000 peritos da OMS, da UNICEF e do Rotary, assim como consultores do programa STOP do Centro de Controlo e Prevenção de Doenças dos Estados Unidos da América, têm prestado apoio à resposta à COVID-19 em toda a Região Africana. Um quarto dos funcionários da OMS que trabalham na área da poliomielite está a dedicar mais de 80% do seu tempo aos esforços de luta contra a COVID-19, e 65% antecipam manter esse compromisso durante pelo menos seis meses.

 

Dois elementos particularmente importantes na resposta à COVID-19 são o rastreio de contactos e a gestão de dados: as ferramentas utilizadas pelas equipas de resposta à poliomielite para rastrear os contactos e monitorizar e propagação do poliovírus foram rapidamente adaptadas para rastrear milhares de casos suspeitos de COVID-19 e para ajudar os países a tomar decisões.

 

“A nossa mais-valia consiste na coordenação diária da recolha de dados e na gestão das equipas de rastreio de contactos. Na maioria dos países, o rastreio de contactos está a ser inteiramente gerido pelas equipas de resposta à poliomielite,” afirma o Dr. Godwin Akpan, Gestor de Dados do Programa de Erradicação da Poliomielite no Escritório Regional da OMS para a África. A sua equipa no centro de Sistemas de Informação Geográfica (SIG) no Escritório Regional da OMS para a África, em Brazzaville, no Congo, está a usar a sua vasta experiência e conhecimento técnico sobre a poliomielite para prestar apoio aos países através de uma variedade de tecnologias de SIG e de softwares, bem como através de soluções manuais para dar resposta à COVID-19.

 

Por exemplo, no Zimbabué, mais de 100 responsáveis de vigilância de doenças estão a utilizar uma aplicação móvel, criada inicialmente para poliomielite, para investigar casos de COVID-19, gerir o rastreio de contactos e comunicar os seus resultados em tempo real.  

Um Gestor de Dados do Programa de Erradicação da Poliomielite da OMS faz uma demonstração prática a funcionários do Ministério da Saúde em Mashonaland da aplicação adaptada Open Data Kit (ODK), que pode ser descarregada em telemóveis e tablets, e que está a ser utilizada para realizar o rastreio de contactos e o acompanhamento de casos suspeitos de COVID-19 em todas as províncias do Zimbabué (excepto Bulowayo), Zimbabué, Junho de 2020. © OMS 

Funcionários do Programa de Erradicação da Poliomielite da OMS prestam formação ao pessoal de rastreio de contactos do Ministério da Saúde do Zimbabué sobre os fundamentos da vigilância da COVID-19 e sobre a utilização da aplicação de telemóvel Open Data Kit (ODK), adaptada para realizar o rastreio de contactos e o acompanhamento em Chitungwiza, Zimbabué, Junho de 2020. © OMS 

A equipa de SIG também está a ajudar os países a desenvolver os seus próprios aparelhos. “Descobrimos que muitos países já tinham as suas próprias ferramentas de rastreio de contactos,” afirma o Dr. Akpan, “por isso ajudámo-los a adaptar as suas ferramentas e a transferir os dados para os painéis de controlo para que os dados pudessem ser automaticamente visualizados, de forma a permitir uma melhor tomada de decisões.” Um dos aspectos mais importantes tem sido assegurar que os dados são armazenados de forma segura, respeitando a privacidade de dados.

 

Além do rastreio de contactos, qualquer estratégia para travar a propagação da COVID-19 tem de incluir testes em grande escala. “No início da pandemia, o número de testes realizados em África era baixo. A rede de laboratórios para a poliomielite da Região Africana, que tem evoluído ao longo dos últimos trinta anos para oferecer uma forte capacidade de testagem, ajudou a aumentar o volume de testagem,” realça a Dra. Nicksy Gumede, Viróloga Regional do Programa de Erradicação da Poliomielite no Escritório Regional da OMS para a África. À excepção de um, todos os 16 laboratórios que fazem actualmente parte desta rede dedicam 70% da sua capacidade ao rastreio da COVID-19. Centenas de testes são realizados todos os dias utilizando máquinas próprias para o rastreio da poliomielite em laboratórios especializados, nomeadamente em países como a Argélia, os Camarões, a Côte d’Ivoire, a Etiópia, Madagáscar, a Nigéria, o Senegal e a África do Sul. Foram também doados recursos de laboratório para vírus da poliomielite a países com uma capacidade de testagem limitada, sem os quais não seria possível conhecer o número exacto de casos. 

Líderes comunitários e funcionários que participam no programa de luta contra a poliomielite realizam uma demonstração de lavagem das mãos e de distanciamento social a membros de uma comunidade nómada como medidas preventivas contra a COVID-19 no Estado de Borno. Nigéria, Abril de 2020 © OMS
Uma supervisora do programa de luta contra a poliomielite da OMS realiza uma sessão de sensibilização sobre a prevenção da COVID-19 com membros da comunidade e mulheres líderes numa povoação no Estado de Borno. Nigéria, Abril de 2020 © OMS

Quando, em Março de 2020, foram introduzidas medidas para travar a propagação da COVID-19, as autoridades nacionais de saúde da região suspenderam as campanhas de vacinação contra a poliomielite. Contudo, mesmo quando os esforços, recursos e financiamento contra a poliomielite foram redireccionados para a luta contra a COVID-19, as equipas de resposta à poliomielite continuaram as suas actividades de vigilância da poliomielite e o planeamento de futuras campanhas de vacinação contra a poliomielite.  Quando a suspensão foi levantada, em Maio, nos países de risco elevado, foram realizadas campanhas contra a poliomielite no Burquina Faso e em Angola no início de Julho, vacinando, em conjunto, mais de um milhão de crianças com menos de cinco anos.  

 

Desde a prestação de apoio no terreno em termos de rastreio de contactos, até a acções de formação e preparação de resposta, “os funcionários do programa de luta contra a poliomielite estão cada vez mais a apoiar os processos de tomada de decisões e de coordenação, participando ao nível do centro de coordenação de emergências,” afirma o Dr. Modjirom Ndoutabe, Coordenador da Equipa de Resposta Rápida da OMS para a Região Africana. 

 

À medida que o seu papel evolui para dar resposta às necessidades em mutação do continente, os funcionários e recursos da região para a luta contra a poliomielite continuarão a contribuir para a resposta à COVID-19, ao mesmo tempo que continuarão os seus esforços para eliminar todas as formas de poliomielite na região e a contribuir para a cobertura universal de saúde. Será esse o verdadeiro legado do programa de erradicação da poliomielite em África.  

Uma vacinadora administra a vacina contra a poliomielite a uma criança respeitando as orientações de prevenção da COVID-19, que incluem não tocar no rosto da criança, durante a retoma de uma campanha de vacinação contra a poliomielite no sul de Angola, Julho de 2020. © Geração/OMS
O dedo de um bebé a ser marcado após ter recebido a vacina oral contra a poliomielite durante uma campanha de vacinação contra a poliomielite, realizada de acordo com as orientações de prevenção da COVID-19, no sul de Angola, Julho de 2020. © Geração/OMS
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